Organizações contam com voluntários para reinserir detentos na sociedade




O coordenador do Projeto Liberty, Marcos
Silveira (ao centro), em visita ao CNJ.

A maior parte dos detentos foi para a cadeia por falta de oportunidade na vida. Com esta ideia em mente, algumas organizações que trabalham com voluntariado lutam contra o preconceito e o medo para ajudar presos e egressos do sistema carcerário a se reinserir na sociedade. E utilizam a criatividade para realizar essas tarefas.

“Ainda enfrentamos muito preconceito para realizar esse tipo de trabalho, pois as pessoas, muitas vezes, infelizmente acreditam que detentos e ex-detentos não têm mais jeito”, lamenta Marcos Silveira, coordenador do projeto Liberty, que atua em Campinas (SP). “É difícil, mas isso vai mudar”.

Apesar da dificuldade, que se reflete em complicações para obter patrocínio e colaboradores voluntários, a organização tem tido sucesso. Criado em 2006, o LIberty já encaminhou 300 ex-detentos a algum tipo de trabalho. Atualmente, o projeto também atende a população de rua, para evitar que ela também se torne detenta, e soropositivos de baixa renda.

Uma das principais atividades, hoje, é a produção de sacolas ecológicas pelos atendidos. De material reciclado, as embalagens são montadas por dez ex-detentos, que assim conseguem, em média, cerca de R$ 700 por mês. O material, fornecido pela empresa BG Flexo, é vendido a mercados da região de Campinas, que, devido à nova regulamentação do Estado de São Paulo, não podem mais oferecer sacolas plásticas a consumidores. Além disso,os ex-detentos recebem cestas básicas, doadas por empresários, que fazem parte do grupo de 20 voluntários colaboradores da organização. Outros ajudam com transporte, oficinas e outros trabalhos eventuais.

De acordo com Marcos Silveira, a atração de voluntários, apesar de difícil, dado o público-alvo da entidade, foi facilitada pelo “selo de qualidade” conferido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O órgão público integrou a organização ao projeto Começar de Novo, que ajuda entidades a reintegrarem detentos à sociedade por meio de geração de renda e aulas de cidadania. “O projeto do CNJ passa confiança a quem quer trabalhar conosco”, diz Silveira, que mesmo assim ressalta a necessidade de mais voluntários. “Queremos fazer o projeto crescer e atender 50 ex-detentos”.


Tem quem queira

O crescimento também faz parte do plano da ONG Tem Quem Queira, atuante no Rio de Janeiro. A organização já atendeu cem detentos, dos quais 15, em regime fechado, aberto e condicional, hoje produzem bolsas e roupas derivadas de materiais publicitários doados por grandes empresas do setor. Os produtos foram desenhados voluntariamente pelas estilistas Isabela Capeto e Renata Abranches e ganharam o prêmio Socioambiental Benchmarking Brasil de 2011.


Bolsas produzidas pelos detentos da Tem Quem Queira

A triagem dos trabalhadores é feita pela Fundação Santa Cabrini, gestora da mão de obra prisional do sistema penitenciário fluminense. Nesse momento os em regime semiaberto são do presídio Oscar Stevenson e os em regime fechado trabalham no núcleo prisional Ferreira Neto, em Niterói. Cada atendido recebe um salário mínimo e abono de um dia de pena a cada três trabalhados. Os frutos de sua dedicação são vendidos a empresas, que oferecem os produtos como brindes a seus clientes.

O objetivo da Tem Quem Queira é inaugurar pelo menos mais duas oficinas ainda este ano, além da que possui com presidiários e a em funcionamento no morro do Turano, na zona norte carioca, onde o trabalho é voltado para a população local. “Meu sonho dourado é espalhar as oficinas por vários lugares do Rio de Janeiro”, afirmou Adriana Gryner, empresária fundadora da ONG, ao governo do Estado.

Para que isso aconteça, tanto em São Paulo quanto no Rio, é preciso superar o preconceito que ainda existe em relação ao trabalho com presidiários e os egressos do sistema prisional. Representantes de ambas as organizações ressaltam que o medo ainda é um impeditivo para esse tipo de atividade se desenvolver mais e pedem colaborações. “O sucesso desse tipo de projeto é revertido totalmente para a sociedade”, afirma Marcos Silveira. “As pessoas saem da cadeia com renda e lições de cidadania. Dificilmente voltam para a vida do crime”.